Hantony Cássio Ferreira da Costa[1]
Willian Alessandro Rocha[2]
Vivemos num momento histórico ímpar, em que um vírus acabou impactando seguramente a vida de todas as pessoas e, em especial, empregadores e trabalhadores. O mundo do trabalho e, por consequência, o Direito do Trabalho jamais serão os mesmos, podendo-se divisar o direito pré-existente e o direito posterior à pandemia.
Com efeito, a COVID-19 afetou o mundo do trabalho de modo bastante severo, obrigando, num primeiro momento, muitas empresas a suspender as suas atividades presenciais, remanejando seus empregados para o trabalho remoto.
Nesse cenário, o direito do trabalho passou a conviver com situações em que ambos os atores da relação de emprego (empregador e empregado) ficaram vulneráveis diante da séria crise de saúde, que não demorou para se tornar também uma crise financeira, encaminhando-se para uma crise social.
Com o retorno gradual das atividades econômicas, os operadores do direito passaram a enfrentar novas temáticas, dentre elas a proteção ao meio ambiente de trabalho.
De fato, como ainda não há vacina para prevenir do novo coronavírus, o retorno dos trabalhadores às suas atividades profissionais potencializou os riscos de contágio da COVID-19, o que exigiu dos empregadores a adoção de medidas preventivas e cautelares, visando reduzir os riscos à saúde dos empregados e de clientes.
De outro lado, muitas entidades sindicais, preocupadas com a saúde dos trabalhadores, buscaram o Poder Judiciário Trabalhista por meio de ações civis públicas visando a adoção de medidas preventivas no meio ambiente de trabalho.
Além disso, algumas entidades sindicais visualizaram a necessidade de deflagração de greve sanitária, ante os graves e iminentes riscos à saúde dos trabalhadores. Como exemplo, os servidores do INSS, em plenária da FENASPS (Federação Nacional dos Servidores de Previdência Social) aprovaram a deflagração de greve sanitária em todo o país a partir do dia 08/09/2020, em defesa da vida[3]. Outras categorias também indicaram o exercício da greve sanitária, tais como petroleiros, professores, trabalhadores do judiciário, previdenciários e docentes universitários.
O tema, como se percebe, se mostra bastante atual e demanda reflexão, sobretudo quando se trata de empresas que exercem atividades essenciais, mormente no setor de saúde. Isso porque em muitas situações pode haver colisão de direitos fundamentais: de um lado, o direito ao meio ambiente de trabalho hígido, à saúde e à segurança dos trabalhadores; de outro, a saúde da população que necessita do tratamento médico emergencial, sobretudo em tempos de pandemia.
Nesse contexto, o presente estudo tem por escopo tratar do tema da greve sanitária e o direito do empregado de se recusar a trabalhar, abordando o direito à saúde e ao meio ambiente de trabalho no âmbito internacional e na esfera nacional.
Para tanto, abordaremos o tratamento dado à saúde e ao meio ambiente do trabalho em âmbito nacional e internacional. Na sequência estudaremos o conceito de greve sanitária, fazendo a distinção com o direito do empregado de se recusar ao trabalho em razão da presença de risco grave e iminente à sua saúde no meio ambiente de trabalho.
Abordaremos a jurisprudência do C. STF a respeito do exercício de greve em atividades essenciais e a possibilidade de utilização de outros instrumentos jurídicos menos lesivos aos direitos fundamentais contrapostos, como a tutela inibitória em ação civil pública promovida pelos sindicatos ou pelo Ministério Público do Trabalho (MPT).
Com base nos estudos, buscaremos responder acerca da possibilidade ou não dos profissionais da saúde, mormente aqueles que trabalham na linha de frente no combate à COVID-19, exercitar o direito de greve sanitária ou de recusa ao trabalho quando o empregador descumpre normas de proteção à saúde dos seus empregados.
A Constituição Brasileira prevê a saúde como direito social (artigo 6º).
Outrossim, a CRFB garante a todos os trabalhadores urbanos e rurais a “redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança” (artigo 7º, XXII).
Já no seu artigo 196, a Constituição disciplina que “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”.
Comentando o citado dispositivo constitucional, MENDES e BRANCO (2018, p. 717) apontam ser possível identificar tanto um direito individual quanto um direito coletivo de proteção à saúde.
Por sua vez, o artigo 200, VIII, da CRFB atribui ao sistema único de saúde a colaboração na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho.
José Afonso da SILVA (2017, p. 24), citando Franco Giampietro, conceitua o meio ambiente do trabalho como sendo “um complexo de bens imóveis e móveis de uma empresa e de uma sociedade, objeto de direitos subjetivos privados e de direitos invioláveis da saúde e da integridade física dos trabalhadores que o frequentam”.
Celso Antônio Pacheco Fiorillo, citado por MARTINS et al. (2020, p. 180), por sua vez, conceitua o meio ambiente do trabalho como “o local onde as pessoas desempenham suas atividades laborais relacionadas à sua saúde, sejam remuneradas ou não, cujo equilíbrio está baseado na salubridade do meio e na ausência de agentes que comprometam a incolumidade físico-psíquica dos trabalhadores”.
Carlos Henrique Bezerra LEITE e Laís Durval LEITE (2020, p. 523) afirmam que:
[…] o meio ambiente do trabalho ecologicamente equilibrado é um direito humano e fundamental dos trabalhadores à sadia qualidade de vida física, psíquica, social e moral no ambiente laboral”, impondo-se “ao empregador (e aos tomadores de serviços em geral) o dever fundamental, decorrente da função socioambiental da empresa, de assegurar a sadia qualidade de vida (física, psíquica e moral) dos trabalhadores, pelo que deve cumprir, efetivamente, as normas de proteção à vida, à saúde, à higiene e à segurança do meio ambiente de trabalho. […]
Tratam-se a saúde e o meio ambiente do trabalho de direitos fundamentais de todos os trabalhadores e da sociedade em geral.
Sendo direitos fundamentais, possuem eficácia vertical e horizontal. Na eficácia vertical, pode o titular do direito (e as entidades coletivas com legitimidade para tanto) exigir do Estado a adoção de medidas positivas (comissivas) ou negativas (omissivas) de proteção da saúde e do meio ambiente do trabalho. Já na eficácia horizontal poderá o titular do direito fundamental exigir que o particular (por exemplo, o empregador) respeite o direito à saúde e ao meio ambiente equilibrado, com medidas omissivas (se abster de exigir trabalho em ambiente que cause elevado risco à saúde e segurança do trabalhador, por exemplo) e comissivas (fornecer equipamentos de proteção individual e coletiva e adotar medidas preventivas no ambiente de trabalho)[4].
Cita-se, a propósito, a ponderação de Georgenor de Sousa FRANCO FILHO e Perlla Barbosa Pereira MAUÉS (2020, p. 514), para quem “o meio ambiente de trabalho configura-se como um direito transindividual, pelo fato de não haver qualquer restrição, garantido, portanto, a todo trabalhador”. Acrescentam os autores que a garantia do meio ambiente do trabalho “emerge da obrigação social do Estado de prover instrumentos que a assegurem, dentre os quais, se pode destacar a greve ambiental trabalhista”.
A prevenção e a precaução são os princípios motores do meio ambiente do trabalho, exigindo-se do empregador, responsável pela sua manutenção (artigo 157 da CLT) medidas que possam eliminar o risco de acidentes e de contração de doenças ocupacionais.
Victor Hugo de ALMEIDA et al, citado por MARTINS et al (2020, p. 180), propõem quatro meios para prevenir os riscos no meio ambiente de trabalho: “a eliminação do risco; a eliminação da exposição do trabalhador ao risco; o isolamento do risco e a proteção do trabalhador”.
O risco nem sempre é eliminável, como no caso da contaminação por COVID-19 e outras doenças infectocontagiosas por profissionais da saúde. Nesses casos, também não é possível eliminar a exposição do trabalhador ao risco, pois a própria natureza da atividade exige que o trabalhador se exponha ao risco, com vistas à proteção e ao tratamento da saúde dos pacientes. Do mesmo modo, não há como isolar o risco, já que a possível doença infectocontagiosa pode estar no paciente que está sendo tratado.
Assim, a única forma de se prevenir o risco desses profissionais é a proteção do trabalhador, com a disponibilização de EPI’s e EPC’s eficazes, além da realização de treinamentos e da higienização constante do ambiente laboral.
Sobre o assunto, é interessante a ponderação de Raimundo Simão de Melo, citado por MARTINS et al (2020, p. 182), no sentido de que “a responsabilidade pela adequação e manutenção dos ambientes de trabalho salubres e seguros é de todos e de cada um ao mesmo tempo”.
A afirmação de MELO está em conformidade com o que dispõem os artigos 157 e 158 da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), atribuindo ao empregador a obrigação de cumprir e fazer cumprir as normas de segurança do trabalho e ao empregado a obrigação de cumprir as orientações do empregador quanto a este aspecto.
Desde 1944, através da Declaração da Filadélfia – que atualmente aparece como anexo à Constituição da Organização Internacional do Trabalho (OIT) – resplandece como princípio motriz das relações do trabalho a dignidade da pessoa humana, a partir do célebre jargão de que “o trabalho não é uma mercadoria”[5]. Ainda no mesmo documento internacional, a OIT já se compromete a auxiliar as Nações do Mundo na execução de políticas que visem a proteção da vida e da saúde dos trabalhadores.
A dignidade da pessoa humana se apresenta no referido diploma internacional não apenas como fundamento, mas também como limite da liberdade econômica, assim como o mesmo princípio aparece nas Constituições brasileiras desde 1934 (SARLET; MARINONI; MITIDIERO, 2018, p. 265).
De igual modo, a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem (1948), em seu artigo XI, reconheceu o direito de toda pessoa à proteção da saúde por “medidas sanitárias e sociais relativas à alimentação, roupas, habitação e cuidados médicos correspondentes ao nível permitido pelos recursos públicos e os da coletividade”. Reconhecimento semelhante é reproduzido em dezembro do mesmo ano pelo artigo XXV da Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Especificamente no contexto das relações de trabalho, o Pacto Internacional sobre os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais – PIDESC (1966) trouxe, em seu art. 7°, o direito a condições justas e favoráveis de trabalho que assegurem especialmente a segurança e a higiene do trabalho. Norma esta desenvolvida no próprio art. 12 do PIDESC como sendo o direito de “toda pessoa desfrutar o mais elevado nível possível de saúde física e mental”, a “melhoria de todos os aspectos de higiene do trabalho e do meio ambiente”, a “prevenção e tratamento das doenças epidêmicas, endêmicas, profissionais e outras, bem como a luta contra essas doenças”, e igualmente a assistência médica respectiva.
O Protocolo de San Salvador (1988) que adere à Convenção Americana sobre Direitos Humanos em Matéria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais também apresenta regramento relevante ao nosso estudo na medida em que, em seu art. 10, reconhece o direito à saúde e, especificamente, à imunização contra as principais doenças infecciosas, prevenção e tratamento das doenças endêmicas e a satisfação das necessidades de saúde dos grupos de mais alto risco e que, por sua situação de pobreza, sejam mais vulneráveis. Além disso, o meio ambiente sadio (art. 11) e a segurança e higiene do trabalho são mencionados (art. 7°)[6].
No âmbito da OIT não são poucas as convenções ratificadas pelo Brasil com a temática da saúde, segurança e meio ambiente do trabalho, por exemplo, as Convenções 12, 16, 42, 81, 115, 119, 120, 126, 133, 134, 136, 139, 148, 152, 155, 161, 164, 167, 170, 174, 176 e 178. A Convenção n° 155 notabilizou-se, dentre outros motivos, por se aplicar a todos os ramos da atividade econômica e profissões, incluindo-se as funções públicas. Além disso, sua concepção de saúde, encartada no art. 3°, “e”, transpôs o mero conceito de saúde como ausência de enfermidade para açambarcar os conceitos promocional e profilático da saúde, o que reorientou a política de saúde para a redução dos riscos.
Mas há uma norma específica na Convenção n° 155 da OIT que passou a ser reproduzida nas mais diversas leis e estatutos do trabalho dos Estados-Partes e que está umbilicalmente ligada à temática da recusa de trabalhar em virtude de condições ambientais do trabalho. Com efeito, a leitura conjunta do artigo 13 com o artigo 19, “f” denota a autorização para que um trabalhador possa, diante de um motivo razoável que represente um grave e iminente perigo para sua vida ou saúde, paralisar sua prestação de serviços.
Na Espanha, a Ley 31/1995, de 8 de noviembre, de prevención de Riesgos Laborales prevê em seu artigo 21 as medidas passíveis de serem tomadas diante de uma situação de risco grave e iminente, apontando, dentre elas, a paralisação da prestação dos serviços. Vejamos o texto:
[…]
O artigo da referida lei espanhola reproduz o conceito de risco grave e iminente da Convenção n° 155 da OIT e o desenvolve, em minúcias, possibilitando aos trabalhadores paralisarem o trabalho, até mesmo de imediato. E, caso o empregador não os permita, legitima os representantes legais dos trabalhadores a fazê-lo. Além disso, o item 4 do artigo 21 da Lei n° 31/1995 esclarece que os trabalhadores não podem sofrer prejuízo algum em decorrência da adoção da paralisação dos trabalhos em virtude do grave e iminente risco, salvo se agirem de má-fé.
De igual modo, o TESTO UNICO SULLA SALUTE E SICUREZZA SUL LAVORO da Itália, que é uma Consolidação das Normas italianas sobre Segurança e Saúde do Trabalho, em seu título I, que dispõe sobre os princípios comuns aplicáveis a todas as atividades econômicas e profissões, reza, em seu artigo 44, sobre o direito à paralisação do trabalho em caso de perigo grave e iminente. Vejamos:
Articolo 44 – Diritti dei lavoratori in caso di pericolo grave e immediato
Também no ordenamento jurídico italiano se verifica a norma no sentido de permitir ao trabalhador paralisar sua prestação de serviços diante de um perigo grave e iminente em seu local de trabalho, o colocando a salvo de qualquer represália ou prejuízo em virtude da sua atitude.
Na França, No Code du travail (Código do Trabalho), parte legislativa, quarta parte (saúde e segurança no trabalho), livro primeiro (disposições gerais), título III (direitos de alerta e afastamento do trabalho)[8], há expressa menção e regramento muito semelhante à Convenção n° 155 da OIT quanto ao direito de paralisação do empregado em caso de perigo grave e iminente de lesão à sua vida ou saúde. Vejamos:
Chapitre Ier : Principes.
Article L4131-1. Le travailleur alerte immédiatement l’employeur de toute situation de travail dont il a un motif raisonnable de penser qu’elle présente un danger grave et imminent pour sa vie ou sa santé ainsi que de toute défectuosité qu’il constate dans les systèmes de protection.
Il peut se retirer d’une telle situation.
L’employeur ne peut demander au travailleur qui a fait usage de son droit de retrait de reprendre son activité dans une situation de travail où persiste un danger grave et imminent résultant notamment d’une défectuosité du système de protection[9].
Article L4131-3. Aucune sanction, aucune retenue de salaire ne peut être prise à l’encontre d’un travailleur ou d’un groupe de travailleurs qui se sont retirés d’une situation de travail dont ils avaient un motif raisonnable de penser qu’elle présentait un danger grave et imminent pour la vie ou pour la santé de chacun d’eux[10].
Além do direito à paralisação do trabalho em razão do perigo grave e iminente, se assegura o direito à indenidade do trabalhador, ou seja, de não sofrer qualquer sanção ou prejuízo salarial em virtude da recusa ao trabalho. De igual modo, o artigo L4131-2 do Code du travail legitima os representantes dos trabalhadores a requerer ao empregador a imediata paralisação da atividade que demonstre perigo grave e iminente de lesão à saúde e segurança dos trabalhadores.
BOUTIRON e ÉLIE (2016, p. 194-195) remarcam que a primeira obrigação dos empregados, na situação acima, é de avisar ao empregador imediatamente acerca do perigo grave e iminente (por isso se chama droit d’alerte) para que o patrão possa tomar as medidas necessárias, mas que tal obrigação não deve ser vista como um pretexto para o empregador impedir a paralisação dos empregados ou os sancionar. Acrescem os autores que, no Direito francês, o descumprimento das regras de saúde e segurança do trabalho é passível de multa que varia de 3750 euros a 9000 euros, além de pena de prisão de um ano, em caso de reincidência, tipificada como o ato de colocar em perigo a vida de outrem.
As legislações das nações europeias são iluminadas pelos princípios do direito ambiental previstos no artigo 191.2 do Tratado sobre o funcionamento da União Europeia, principalmente nos princípios da precaução, prevenção e do poluidor-pagador. Na referida diretiva fica expresso como um dos objetivos da referida norma a proteção da saúde humana. Tais normas são utilizadas efusivamente em matéria de meio ambiente do trabalho, assim como também é feito no direito brasileiro.
A análise abrangente de todas ou de uma larga escala das legislações nacionais refoge ao escopo deste trabalho. Os textos acima são trazidos apenas para, através do direito comparado e da norma de abertura prevista no art. 8° da CLT, iluminar a correta interpretação do direito à recusa de trabalho no contexto das greves ambientes, e mais particularmente, das greves sanitárias.
Na problemática enfrentada no presente estudo, é preciso e de extrema relevância distinguir a greve, incluindo-se a ambiental e a sanitária, do direito de recusa a trabalhar relacionado a questões ambientais.
No Brasil, a par dos conceitos doutrinários de greve, o art. 2° da Lei n° 7.783 de 28 de junho de 1989 definiu o referido instituto como sendo a “suspensão coletiva, temporária e pacífica, total ou parcial, de prestação pessoal de serviços a empregador”. O conceito não resta a salvo de críticas, na medida em que não alberga movimentos coletivos dos trabalhadores em que se tenciona pressionar o empregador por melhores condições de trabalho, a despeito de não implicar em paralisação do trabalho, como na chamada “operação tartaruga” (SILVA, H.,2015, p. 169).
Lembra CARVALHO (2018, p. 522) que “a greve é um conceito que remete a um fato (a paralisação da atividade), a uma causa (a defesa de um interesse coletivo) e a um fim (o retorno à normalidade com condições mais justas de trabalho)”. Além disso, a greve é vista, internacionalmente, como um direito individual que se exerce coletivamente. Significa dizer que a greve como fato social se mostra como adesão coletiva dos trabalhadores, em maior ou menor grau, mas que, no resguardo do direito à liberdade de cada trabalhador de aderir ou não, se identifica como um direito individual relacionado à liberdade de associação. Neste sentido, com maestria a lição de MALLET (2015, p. 35-37):
[…] A greve é manifestação essencialmente coletiva. (…) Em rigor, a greve apresenta, do ponto de vista ontológico, tanto uma faceta ou dimensão individual como uma coletiva, o que lhe confere estrutura complexa. De um lado, a deflagração de greve supõe manifestação e aprovação dos interessados (…) Eis sua dimensão coletiva ou, como também se pode dizer, seu momento genético. (…) No entanto, a aprovação da paralisação pelo grupo cria para o trabalhador apenas o direito de cessar a prestação de serviço. Não impõe nenhuma obrigação. (…) Aí está a inapagável dimensão individual da greve, ou seja, seu momento funcional, que se segue ao coletivo. E essa dimensão é inalienavelmente de titularidade do trabalhador. […]
No mesmo sentido e com o complemento de DELGADO (2017, p. 1618), é assente em doutrina que o caráter coletivo da greve se aplica, inclusive, nos protestos trabalhistas por condições ambientais mais favoráveis, o que não impede de o movimento afetar toda a empresa ou apenas algum dos seus setores.
MALLET (2015, p.39) observa ainda que
[…] é incorreto dizer, ao menos do ponto de vista teórico, que um único trabalhador não possa fazer greve ou que a greve suponha que ‘le refus de travail émane de plusiers salariés, agissant collectivement’. Somente quando o direito positivo exige pluralidade de trabalhadores – como ocorre na Nova Zelândia – é que faz sentido aludir a tal requisito. Ontologicamente não é algo essencial à greve. Afinal, aprovada a greve pelo grupo, se apenas um trabalhador deixa de trabalhar, está ele no exercício do seu direito de greve, ainda que se ache o movimento inviabilizado e fadado ao rápido encerramento […].
Na jurisprudência trabalhista brasileira já há casos reconhecidos de greve ambiental de pouquíssimos trabalhadores, demonstrando que a pluralidade não é elemento da greve.
João Pires Vieira COSME (2017, p. 14), em dissertação de mestrado, tratando sobre o direito de greve em Portugal e suas limitações imanentes, acresce que a dimensão coletiva se apresenta na decisão de convocar a greve, por parte dos sindicatos ou assembleias de trabalhadores. Já a dimensão individual, como dito acima por nós, consistiria exatamente no momento de adesão individual do trabalhador, seja ele filiado ou não ao sindicato.
Cresce no mundo a concepção de que o direito de greve decorre do direito à liberdade de associação e, considerando-se que tal direito encontra-se encartado em diplomas internacionais como a Declaração de Filadélfia (anexa à Constituição da OIT), o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e no Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC), haveria a aceitação por parte dos seus signatários de respeito ao direito de greve. Mais que isso, ao aceitar os princípios da OIT, constantes na Declaração de Filadélfia (e a liberdade de associação é um destes pilares), todos os Estados-Partes teriam o dever de adequar suas legislações e práticas nacionais de modo a contribuir para tornar efetivo o respeito aos princípios fundamentais da OIT, independentemente de terem ratificado ou aderido a uma Convenção específica. A ampla adesão dos Estados-Partes a uma determinada Convenção, a participação na OIT e até a assinatura de tratados bilaterais comerciais específicos tem sido vista por pesquisadores como uma consolidação de que o direito de greve decorreria de um costume internacional. Rememore-se que esta fonte do direito tem dois pressupostos: a prática generalizada do respeito ao direito de greve, independentemente de omissão legislativa (costume praeter legem) e sua aceitação como obrigatória. Neste sentido, International Trade Union Confederation – ITUC (2014, p. 90):
The trajectory of international discourse on the right to strike strongly suggests the existence of a customary international law norm. State practice reflected in most countries’ constitutions, laws, and decisions of national courts confirm the right to strike. The limits may vary from country to country, but underlying them is an international consensus that the right exists, and that limits must be reasonable. Further, States respect this right out of a sense of legal obligation, not merely a moral one[11].
Essa concepção é relevante para entender como decisões judiciais nos Estados Unidos e China tem reconhecido o direito de greve diretamente decorrente de um costume internacional mesmo sem reconhecimento pela legislação interna ou a despeito da ausência de ratificação da Convenção n° 87 da OIT. No caso específico dos Estados Unidos, utiliza-se com frequência o fato de os Estados Unidos reconhecerem o direito no tratado de livre comercial do NAFTA (ITUC, 2014, p. 90).
A concepção é trazida neste estudo exatamente porque a COVID-19 se mostrou um fato social de proporções universais, assim como a necessidade de proteção ao meio ambiente de trabalho em todos os países do mundo.
Dentro do âmbito do conceito de greve, a doutrina teceu o conceito de greve ambiental, que seria a deflagração de greve ocasionada por más condições ambientais de trabalho, que tem a finalidade de “preservar e defender o meio ambiente do trabalho e a saúde do trabalhador” (MELO, 2017, p. 123). A greve sanitária seria também uma espécie de greve ambiental relacionada a aspectos de higiene e saúde no meio ambiente de trabalho. O termo “sanitário” diz respeito exatamente à conservação da saúde e da higiene[12]. A diferença semântica entre a acepção comum do termo e a jurídica é que o direito à saúde é visto não só como “conservação”, mas como direito de prevenção, promoção e preservação da saúde, na forma da Convenção n° 155 da OIT.
Aqui vale realizar importante distinção entre a greve ambiental (albergando a sanitária) e o direito de recusa de trabalhar.
Além das considerações do direito comparado vistas no tópico anterior, no Brasil o direito de recusa de trabalhar em virtude de um perigo grave e iminente – embora não esteja previsto de maneira tão explícita como nos textos legais dos países europeus (pois lá resta claro que se trata de um direito subjetivo) – encontra ressonância no art. 161 da CLT e na Norma Regulamentadora n° 3 da Portaria SEPRT n° 1068/2019, que tratam do embargo e interdição e dispõem pormenorizadamente do procedimento de caracterização do risco grave e iminente, considerando este como “toda condição ou situação de trabalho que possa causar acidente ou doença com lesão grave ao trabalhador” (item 3.2.1 da NR-3). Além disso, algumas Constituições Estaduais tratam do tema, como a do Estado de São Paulo, cujo artigo 229, § 2º, prevê: “Em condições de risco grave ou iminente no local de trabalho, será lícito ao empregado interromper suas atividades, sem prejuízo de quaisquer direitos, até a eliminação do risco”.
Dizemos que os textos legais brasileiros não são tão explícitos quanto os europeus porque criaram procedimento burocrático que depende da declaração do nível do risco por parte do Auditor Fiscal do Trabalho para poderem paralisar o trabalho sem sofrerem perda salarial, o que é incompatível com a urgência que a autotutela do direito à vida e à saúde requer. Nada obstante tal falha no texto brasileiro, com o reconhecimento da supralegalidade dos tratados internacionais sobre direitos humanos, é possível requerer a eficácia direta dos arts. 13 e 19 da Convenção n° 155 da OIT nas relações de trabalho brasileiras e paralisar o trabalho diante do perigo grave e iminente.
Embora a existência de um risco grave e iminente possa ensejar a deflagração de uma greve ambiental (ou sanitária), aquele não é pressuposto desta, e tampouco se limita ao contexto dos movimentos paredistas. O direito individual de greve não prescinde da dimensão coletiva em que a categoria ou um conjunto de trabalhadores realizam o indicativo de greve, ainda que poucos resolvam paralisar a prestação de serviços. Na greve sempre há uma dimensão coletiva, uma afetação do meio ambiente de trabalho com perspectiva metaindividual. Já o direito à recusa de trabalhar diante de risco grave e iminente é direito individual puro que prescinde de qualquer repercussão coletiva. Tal concepção permite, por exemplo, que um trabalhador específico pertencente aos grupos de risco da COVID-19 se recuse a trabalhar em caso de ausência de condições sanitárias seguras que o protejam no ambiente de trabalho, ou que determinado operador de uma máquina insegura paralise sozinho sua prestação de serviços em virtude da inadequação da máquina, sem necessidade de que os demais trabalhadores assim também procedam. Nessas situações, o direito de recusa ao trabalho se aproxima mais do exercício do jus resistentiae do que da greve propriamente dita.
Tal distinção é fundamental para preservar a vida e a saúde dos trabalhadores integrantes das categorias as quais a jurisprudência brasileira nega o exercício do direito de greve, conforme se verá no tópico seguinte, como é o caso dos profissionais da saúde.
Sobre os conceitos de risco, iminência e gravidade, SOUZA, BARROS e FILGUEIRAS (2017, p. 36-39), em interessante artigo sobre o tema, dizem que o risco “pode ser entendido como a chance ou possibilidade de consequências negativas para a saúde e a integridade física ou moral do trabalhador, relacionadas ao trabalho”, que são considerados graves “os riscos passíveis de gerar consequências não reversíveis aos trabalhadores, como fatalidades, danos e incapacidades laborativas”, a arrematam que:
[…] a interpretação restritiva do conceito de iminência como sinônimo de “potencial efeito imediato” não se sustenta sequer no campo da Estatística: é impossível afirmar a proximidade temporal de um evento tendo como base somente o conhecimento da sua chance ou probabilidade de ocorrência, subjetivamente determinada. […]
A iminência, segundo os autores, estaria mais relacionada à exposição das pessoas ao risco que propriamente à imediatidade do evento.
ALAMBRA (2020, p. 5), estudando as medidas tomadas pela Espanha durante a pandemia da COVID-19, afirma que no referido país se deu preferência ao teletrabalho. Contudo, quando isto não se mostrou possível, deu-se prevalência ao direito à saúde e à segurança do trabalhador. E quando tais condições não pudessem ser asseguradas, se poderia proceder à suspensão do contrato de trabalho.
Nos parece que a opção pela suspensão, e não pela interrupção, se deve muito mais a questões de política econômica que propriamente ao direito do trabalho, pois os governos optaram por tratar a questão como assistencial para fins de recuperar a economia, as empresas e os postos de trabalho. Em não se tratando de pandemia, certamente o caso seria de interrupção por ausência de oferta de condições ambientais seguras de trabalho.
SACHS (2020, p. 3), estudando o contexto da França na pandemia da COVID-19 também noticiou o entendimento daquele país de que o trabalhador poderia paralisar sua prestação de serviços se houvesse uma causa razoável para acreditar que o empregador não estava ofertando medidas apropriadas para garantir condições de trabalhos seguras. A autora reitera o direito subjetivo individual do trabalhador a recusar prestar seus serviços, mas também que o empregador tem o direito de ser notificado sobre as condições ambientais antes da paralisação para que possa corrigir as falhas[13].
Assim, é notório que os instrumentos internacionais e nacionais convergem na direção da prevalência do direito à saúde e à vida mesmo no contexto da pandemia, embora saibamos que a análise das atividades essenciais exija leituras peculiares, diante do atendimento das necessidades sociais impreteríveis (para se apoderar de uma expressão do direito português) ou os serviços cuja paralisação resultem em prejuízo irreparável (expressão do direito brasileiro).
A problemática que passaremos a responder é se os trabalhadores das atividades essenciais, durante a pandemia da COVID-19, estariam absolutamente impossibilitados de realizar greves ambientais ou de exercitar o direito à recusa de trabalhar por ausência de condições mínimas que os protegessem contra o conoravírus ou se haveria algum campo de conformação (concordância prática) entre o direito à vida e à saúde e o direito ao atendimento das necessidades inadiáveis da sociedade.
O direito de greve, nas diversas constituições nacionais que o preveem, permite, assim como no Brasil, seu regramento e delimitação por normas infraconstitucionais. Assim é que a Lei n° 7.783/89 traz a previsão de atividades essenciais que seriam aquelas destinadas à prestação de serviços inadiáveis à sociedade. E o próprio diploma legal citado dispõe que necessidades inadiáveis são “aquelas que, não atendidas, coloquem em perigo iminente a sobrevivência, a saúde ou a segurança da população”.
As atividades essenciais possuem um regramento específico quanto ao momento de oferta do pré-aviso de greve e de número mínimo de trabalhadores que devam permanecer ativados. Ainda assim, não se impede o exercício do direito de greve nas referidas atividades. A mesma realidade é descrita em Portugal COSME (2017). Já na OIT, além da distinção entre serviços essenciais e não essenciais, ainda há um terceiro gênero chamado de serviços de “importância transcendental”, na dicção de URIARTE et al (2002, p. 30-31):
[…] Em alguns países, a noção de serviços essenciais é usada na legislação para designar serviços nos quais não se proíbe a greve, mas pode ser imposto um serviço mínimo de funcionamento; em outros países, a noção de serviços essenciais é utilizada para justificar importantes restrições inclusive a proibição da greve, e este é precisamente o sentido da expressão “serviços essenciais” para os órgãos de supervisão da OIT quando a utilizam na formulação de seus princípios. […] entre serviços essenciais (em que a greve pode ser proibida) e serviços não essenciais (em que não se pode proibir), os órgãos de supervisão da OIT utilizam um conceito intermediário que é o de serviços de “importância transcendental” (terminologia da Comissão de Peritos), serviços não essenciais em que, no parecer dos órgãos de supervisão da OIT, não se pode proibir a greve, mas pode-se impor um serviço mínimo de funcionamento na empresa ou instituição de que se trate. […] Quando a Comissão de Peritos utiliza a expressão “serviços essenciais” refere-se unicamente aos serviços essenciais no sentido estrito do termo, isto é, àqueles cuja interrupção pode ter consequências para a vida, a segurança ou a saúde da pessoa, nos quais se poderia justificar a imposição de restrições e mesmo proibições, que deveriam, entretanto vir acompanhadas de garantias compensatórias. Considera, porém, aceitável, em certos casos, o “serviço mínimo” e, concretamente, “nas situações em que não parece justificar-se uma limitação importante ou a proibição total da greve e em que, sem pôr em dúvida o direito de greve da grande maioria dos trabalhadores, poder-se-ia procurar garantir a satisfação das necessidades básicas dos usuários ou o funcionamento contínuo das instalações e em condições de segurança” […]
Conforme visto, no Brasil se utiliza a expressão serviços essenciais com o sentido de que sejam aqueles serviços em que não poderá haver paralisação total das atividades, e não no sentido em que a greve esteja absolutamente proibida.
A par disso, o Supremo Tribunal Federal brasileiro, no julgamento da Reclamação n° 6568/SP – que possuía o objeto apenas de averiguar suposta afronta ao quanto decidido na ADI 3395 (ausência de competência da Justiça do Trabalho para julgar ações de servidores públicos com vínculo estatuário ou jurídico-administrativo com o Poder Público) – teceu comentários, ainda que obter dictum, do que considerava ser atividades impossibilitadas de exercer o direito de greve. Apesar de o Estado de São Paulo requerer que a proibição da greve para as atividades policiais fosse declarada também como objeto principal (principaliter tantum) da Reclamação, não se formou maioria para se declarar inviabilizado o exercício de greve pelas atividades descritas no acórdão.
De todo modo, a posição de alguns ministros (Eros Grau, Gilmar Mendes e Cezar Pelluso) sinaliza a compreensão de que a greve estaria proibida às atividades policiais, por exercerem atividade armada e por estar ligada à segurança da população, aos militares, em virtude do art. 142, §3°, IV, da CRFB, aos membros de poder (magistrados, políticos, chefes do Poder Executivo) e ao Ministério Público, em virtude da impossibilidade prática de o Estado se mostrar ausente, e aos profissionais da saúde, em virtude da natureza do serviços e do princípio da continuidade dos serviços de natureza pública. Vejamos trecho representativo desse pensamento, extraído do v. acórdão:
[…] a relativização do direito de greve não se limita ao policiais civis. A exceção estende-se a outras categorias. Servidores públicos que exercem atividades das quais dependam a manutenção da ordem pública e a segurança pública, a administração da Justiça – onde as carreiras de Estado, cujos membros exercem atividades indelegáveis, inclusive as de exação tributária – e a saúde pública não estão inseridos no elenco dos servidores alcançados por aquele direito. Aqui prevalecerá, a conformar nossa decisão, a doutrina do duplo efeito […]
[…] Note-se, quanto às atividades relacionadas à prestação dos serviços de saúde – serviço público que a iniciativa privada pode exercer livremente, nos termos do que define o artigo 199 da Constituição (isto é, independentemente de permissão ou concessão) – que a recusa dessa prestação é inadmissível mercê, na dicção de Karl Larenz, de limitação imanente ao próprio instituto contratual. Essa recusa contraria os bons costumes e caracterizará, em certas circunstâncias, o delito de omissão de socorro […]
O Relator da Reclamação, o Min. Eros Grau, também deixou expresso em seu voto que a compreensão dos serviços essenciais impossibilitados ao exercício de greve se aplicaria tanto ao setor público quanto ao privado. O referido ministro chegou a cogitar, inclusive, de uma omissão de socorro, caso as atividades de polícia ou de saúde deflagrassem a greve.
Chama particular atenção a vedação ao exercício de greve aos profissionais da saúde, em virtude do objeto do nosso estudo, qual seja, a possibilidade de deflagração de greve sanitária no contexto da pandemia da COVID-19. Estariam os profissionais da saúde obrigados a trabalhar, na pandemia, mesmo quando não lhe são ofertadas condições mínimas de saúde, higiene e segurança no trabalho, como o fornecimento de equipamentos de proteção individuais?
Raimundo Simão de MELO (2020, p. 615-616) argumenta que aos profissionais da saúde não se poderia exigir o sacrifício das suas próprias vidas quando não se lhes ofertam as condições mínimas de proteção à saúde e à vida. Vejamos:
[…] Decorre do direito natural e tem agasalho no direito positivo brasileiro, que ninguém é obrigado a trabalhar colocando sua saúde e vida em risco grave e iminente, mesmo que seja para salvar outras vidas! No caso da saúde, o artigo 22 do Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem estabelece que o profissional pode se recusar a executar atividades que não sejam de sua competência técnica, científica, ética e legal ou que não ofereçam segurança ao profissional, à pessoa, à família e à coletividade.
[…] A resposta, no ponto do trabalho a que chegamos é simples e objetiva: se não forem fornecidos pelos empregadores e tomadores de serviços os Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) específicos e adequados para cada situação e não adotadas demais providências preventivas necessárias, os trabalhadores não são obrigados a trabalhar e colocar em risco grave e iminente suas vidas, mesmo que seja para salvar outras vidas. Aqui pode até haver um conflito entre o direito à vida de quem trabalha e o direito à vida das demais pessoas, prevalecendo, como parece ser óbvio e natural, a vida de quem sai de casa, do necessário isolamento, para trabalhar em prol dos outros seres humanos. (p.616)
A passagem do Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem, acima citada por MELO nos faz refletir sobre a necessidade (enquanto elemento do princípio da proporcionalidade, utilizado na técnica de ponderação do conflito entre princípios constitucionais) de sacrificar, de fato, o direito à greve. Isso porque em Portugal já se reconheceu o direito de os profissionais de Enfermagem deflagrarem a greve, mantendo-se um conjunto de serviços mínimos considerados como necessidades impreteríveis e inadiáveis como os cuidados de enfermagem nas Unidades de Atendimento Permanente, nos Cuidados Intensivos (UTIs), no Bloco Operatório de urgência (Centros Cirúrgicos) e programados, na Hemodiálise e nos Tratamentos Oncológicos (COSME, 2017).
Nos parece que a consideração da impossibilidade de exercício de greve e a necessidade de fixação dos serviços mínimos (em quantidade e espécie) só podem ser analisados casuisticamente, e não a priori. Assim, é evidente que em tempos de pandemia não se cogitaria em reduzir a força de trabalho dos profissionais de saúde em uma greve por motivos econômicos. E até concordamos, em que pese o brilhantismo corriqueiro de Raimundo Simão de Melo, que seja possível ao Estado brasileiro obstar o exercício do direito de greve, inclusive ambiental, em casos de crise aguda, como a COVID-19 (e tal linha de pensamento tem amparo na interpretação da Comissão de Peritos da OIT, conforme vimos).
Todavia, essa consideração apenas pode ser aplicada em se tratando do fenômeno da greve, em sua dimensão coletiva. Se se pensar no direito subjetivo individual à recusa de trabalhar em virtude de risco grave e iminente, nos parece que outra deve ser a compreensão, com o que concordamos com MELO (2020) quando este defende que não se pode exigir de ninguém que arrisque, desmesuradamente, sua vida e saúde para salvaguardar a vida de terceiros.
Dizemos desmesuradamente porque o risco à saúde e à vida dos profissionais de saúde já existe em suas atividades comezinhas, e estes profissionais tem, de fato, o dever de socorrer mesmo diante desse risco. Todavia, quando o risco se torna extremamente acentuado (na forma da NR-3), grave e iminente, destoando do risco comum – na forma da jurisprudência do C. TST[14] – entendemos que não se poderia obstar o direito à recusa de trabalho que tem envergadura supralegal, apta a paralisar qualquer consideração de tipificação enquanto delito de omissão de socorro na forma do art. 135 do Código Penal, até porque o tipo deste é claro ao mencionar que o delito só existe se alguém se omite em socorrer, “quando não haveria risco pessoal”. Ademais, o Código Penal afasta a antijuridicidade da conduta quando realizada em estado de necessidade (artigos 23, I, e 24).
Deve-se ponderar até mesmo a opção jurisprudencial brasileira em sacrificar plenamente o exercício do direito de greve a certas atividades quando não há qualquer mecanismo compensatório da proibição do exercício deste direito, conforme dito por URIARTE (2002, p. 30-31). Dentre os mecanismos compensatórios previstos pela OIT estão a mediação e arbitragem, instrumentos que nas referidas atividades poderiam ser tidos como imprescindíveis para preservar o núcleo mínimo do direito de greve.
No atual estágio do pós-positivismo, os princípios, valores e direitos constitucionais ganham especial realce, força normativa e aplicabilidade imediata aos casos concretos. Contudo, há a compreensão de que, no caso concreto, eventual conflito deve ser solvido com o mínimo sacrifício de um dos direitos em detrimento apenas episódico do outro.
Ante a aparente colisão entre princípios constitucionais, cabe ao intérprete avaliar quais dos princípios preponderam, buscando sempre a harmonização e a concordância prática entre eles.
Para solução de casos envolvendo a colisão de princípios, ALEXY (2015, p. 154) sugere a aplicação da “lei da ponderação”, a qual reza que “quanto maior o grau de descumprimento de ou de interferência em um princípio, maior deve ser a importância do cumprimento do outro princípio”.
O filósofo alemão explica a sua teoria nos seguintes termos:
A lei da ponderação mostra que a ponderação pode ser dividida em três passos ou níveis. No primeiro nível trata-se o grau de descumprimento ou de interferência em um princípio. A ele se segue, no próximo nível, a identificação da importância do cumprimento do princípio oposto. Finalmente, no terceiro nível, identifica-se se a importância do cumprimento do princípio oposto justifica o descumprimento do outro princípio ou a interferência nele.
Além da técnica da ponderação, deve-se buscar a concordância prática entre os princípios, isto é, buscar aplicá-los em conjunto, na medida do possível, preservando-os ao máximo.
BARROSO (2018, p. 344) ensina o seguinte no que toca à concordância prática:
Portanto, na harmonização de sentido entre normas contrapostas, o intérprete deverá promover a concordância prática entre os bens jurídicos tutelados, preservando o máximo possível de cada um. Em algumas situações, precisará recorrer a categorias como a teoria dos limites imanentes: os direitos de uns têm de ser compatíveis com os direitos de outros. E em muitas situações, inexoravelmente, terá de fazer ponderações, com concessões recíprocas e escolhas.
Além disso, a colisão dos princípios deve ser analisada levando em consideração o postulado da proporcionalidade (na dicção de Humberto Ávila) ou da máxima da proporcionalidade (na dicção de Robert Alexy).
Segundo o filósofo alemão (ALEXY, 2017, p. 116-117),
[…] afirmar que a natureza dos princípios implica a máxima da proporcionalidade significa que a proporcionalidade, com suas três máximas parciais da adequação, da necessidade (mandamento do meio menos gravoso) e da proporcionalidade em sentido estrito (mandamento do sopesamento propriamente dito), decorre logicamente da natureza dos princípios, ou seja, que a proporcionalidade é deduzível dessa natureza […].
Nas palavras de ÁVILA (2018, p. 206), o postulado da proporcionalidade
[…] se aplica apenas a situações em que há uma relação de causalidade entre dois elementos empiricamente discerníveis, um meio e um fim, de tal sorte que se possa proceder aos três exames fundamentais: o da adequação (o meio promove o fim?), o da necessidade (dentre os meios disponíveis e igualmente adequados para promover o fim, não há outro meio menos restritivo do(s) direito(s) fundamentais afetados?) e o da proporcionalidade em sentido estrito (as vantagens trazidas pela promoção do fim correspondem às desvantagens provocadas pela adoção do meio?) […]
Nesse passo, tem-se de um lado a saúde e segurança dos trabalhadores e a proteção do meio ambiente do trabalho, direitos fundamentais previstos nos artigos 7º, XXII, e 200, VIII da CRFB, sendo legítima, em princípio, a defesa desses direitos mediante a deflagração de greve sanitária (artigo 9º da CRFB) ou do exercício do direito de resistência (artigo 13 da Convenção 155 da OIT).
De outro lado, tem-se a saúde como direito fundamental de toda a sociedade (artigo 196 da CRFB).
Ao se permitir a greve sanitária dos profissionais da saúde, mormente em período de severa crise de saúde, quando enfrentamos a maior pandemia conhecida pela nossa geração, haveria uma interferência muito grande no direito à saúde de todas as pessoas, num quase esvaziamento do direito fundamental previsto no artigo 196 da CRFB.
A medida (greve sanitária) se revelaria, em princípio, desproporcional, pois, embora seja adequada à sua finalidade – já que pode compelir o empregador a adequar as condições do meio ambiente laboral – não atenderia à máxima da necessidade (vista como elemento do postulado da proporcionalidade, na acepção dada por Humberto Ávila), tendo em vista que não seria o meio menos restritivo ao direito à saúde da população em geral, dentre os meios disponíveis e igualmente adequados para promover a saúde e segurança dos trabalhadores.
Vale dizer, o meio escolhido pela entidade sindical, ao optar pela greve sanitária, é muito restritivo ao direito à saúde de toda a população, pois poderia ocasionar o colapso do sistema de saúde num momento histórico de que mais se precisa dele.
E há outros meios menos restritivos ao direito fundamental à saúde da sociedade, tais como o ajuizamento de ações civis públicas, pleiteando tutelas inibitórias e coercitivas, visando obrigar o empregador ao cumprimento das normas de saúde e segurança dos seus empregados. A ação judicial, inclusive com pedido de tutela de urgência ou de evidência (artigos 300 e 311 do CPC e 12 da LACP – Lei da Ação Civil Pública), pode se revelar como meio efetivo para garantir aos empregados um meio ambiente de trabalho hígido e, por conseguinte, reduzir os riscos à sua saúde e segurança, sem que, com isso, se vulnere a saúde de toda a população, havendo uma concordância prática entre os princípios.
Outrossim, não se nega que o trabalhador, individualmente considerado, possa recusar a prestação de serviços em caso de risco grave e iminente (artigo 13 da Convenção n. 155 da OIT), sem prejuízo dos seus salários e sem suportar qualquer sanção por tal atitude.
As astreintes impostas para cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer (artigos 11 da LACP e 536, § 1º do CPC) determinada na ação civil pública podem ser o bastante para compelir o empregador a adequar a sua conduta, protegendo a saúde e segurança dos seus trabalhadores. Segundo SANTOS (2018, p. 143), “as astreintes têm por finalidade coagir o infrator, financeira e psicologicamente, a cumprir a decisão judicial”.
Não sendo o suficiente a multa fixada, é possível, além de majorá-la (artigo 537, § 1º, do CPC), adotar outras medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar a tutela do meio ambiente do trabalho e a saúde e a segurança dos trabalhadores (artigo 139, IV, do CPC), tais como o bloqueio de repasses de verbas públicas até a adequação da conduta.
Não tendo as medidas adotadas alcançado o desiderato de persuadir o empregador a ajustar a sua conduta, seria possível, então, após demonstrada a ineficácia das medidas anteriores, o exercício do direito de greve sanitária pelos empregados do setor de saúde, como ultima ratio para proteção do direito fundamental à saúde e à segurança dos trabalhadores e ao meio ambiente de trabalho sadio, desde que o empregador fosse informado antecipadamente da intenção em deflagrar a greve (direito à informação previsto também na Convenção n° 155 da OIT) e que fossem assegurados os serviços para atendimento das necessidades inadiáveis da população.
Haveria uma limitação do direito de greve, justificada pela importância da continuidade das atividades laborativas no setor de saúde, mormente no período de pandemia. Seria mantido, contudo, o seu núcleo duro, garantindo-se o exercício do movimento paredista quando ele se mostre necessário para garantir a saúde e segurança dos trabalhadores, notadamente, quando não houver, no caso concreto, outro meio menos gravoso para atingimento desta finalidade.
Assim, buscando a concordância prática entre todos os princípios envolvidos, o exercício do direito de greve sanitária pelos profissionais da saúde, notadamente aqueles que estão na linha de frente do combate à COVID-19, ficaria condicionado à prévia adoção de outras medidas, tais como a negociação coletiva e o ajuizamento de ação civil pública, sendo possível a deflagração do movimento paredista apenas após demonstrado que outras medidas menos lesivas ao direito de toda a sociedade à saúde se mostrarem ineficazes.
Sugerimos o crivo judicial por ausência de outros mecanismos compensatórios obrigatórios no direito brasileiro para as categorias que não podem fazer greve, diferentemente da arbitragem e mediação sugeridas pela OIT e da análise em vinte e quatro horas existente no direito espanhol, já comentados em tópico anterior.
Vale dizer, em situações extremas, seria possível a deflagração da greve sanitária até mesmo nas atividades essenciais, como no setor de saúde, a fim de garantir a saúde dos trabalhadores e um meio ambiente de trabalho hígido. A propósito, José Afonso da SILVA (2017, p. 24), ao tratar do meio ambiente do trabalho, pondera que “a proteção da segurança do ambiente de trabalho significa proteção do ambiente e da saúde das populações externas aos estabelecimentos industriais, já que um ambiente interno poluído e inseguro expele poluição e insegurança externa”.
Parafraseando o doutrinador acima citado, a proteção do meio ambiente de trabalho dos profissionais de saúde significa a proteção da saúde de toda a população que utiliza os serviços de saúde, já que a ausência de equipamentos eficazes de proteção, coletivos e individuais, coloca em risco não somente os profissionais de saúde, mas também os pacientes e demais usuários do serviço.
Logo, ainda que de modo restrito, deve ser assegurado aos profissionais de saúde o exercício do direito de greve sanitária, quando não houver outros meios menos restritivos ao direito à saúde da população em geral e igualmente eficazes à proteção do meio ambiente do trabalho, sugerindo que a deflagração da greve seja precedida de outras medidas administrativas e/ou judiciais, possibilitando-se o exercício do movimento paredista após se mostrarem ineficazes as medidas indutivas, sub-rogatórias, mandamentais e coercitivas tomadas com o objetivo de persuadir o empregador a ajustar a sua conduta.
Observe-se que não se trata propriamente de autorização judicial prévia para o exercício da greve, mas de utilização de meios proporcionais para garantir o direito à saúde dos trabalhadores e a higidez do meio ambiente de trabalho. A propósito, a rigor, o Juiz do Trabalho não teria competência para deliberar sobra a greve sanitária, já que o dissídio de greve é de competência funcional dos Tribunais Regionais do Trabalho ou do Tribunal Superior do Trabalho, a depender do âmbito de atuação da empresa.
De se ver que o artigo 11 da LACP permite inclusive a determinação da cessação da atividade pelo juiz, de modo que a deflagração de greve pela categoria obreira se mostra uma medida menos lesiva do que poderia ser adotada no âmbito da ação civil pública, justificada, no caso de proteção do meio ambiente de trabalho dos profissionais de saúde em tempos de pandemia, pela ponderação dos interesses envolvidos no litígio, após constatado que as medidas menos lesivas ao direito à saúde da população não se mostrarem eficazes para a proteção do meio ambiente de trabalho.
Portanto, verifica-se ser plenamente possível a harmonização, no caso concreto, entre os direitos à saúde, ao meio ambiente de trabalho, à greve e à continuidade da prestação dos serviços essenciais.
Em razão da pandemia da COVID-19 e dos evidentes riscos de contágio da doença pelos trabalhadores no local de trabalho, o tema do meio ambiente de trabalho se mostra atual e de fundamental relevância, pois a saúde e segurança dos trabalhadores são protegidos por diplomas internacionais e pela Constituição Brasileira.
As normas internacionais e nacionais (constitucionais e infraconstitucionais) também garantem o exercício do direito de greve, inclusive para proteção do meio ambiente de trabalho (greve ambiental e, especificamente para proteção de contágio de doenças, a greve sanitária).
As normas internacionais e nacionais asseguram também aos trabalhadores o direito de resistência, garantindo-lhes o direito de se recusar a trabalhar, quando o meio ambiente de trabalho lhes apresentar condições de risco grave ou iminente à sua saúde e segurança.
De outro lado, algumas categorias se veem na contingência de se expor ao risco de contágio em razão da natureza essencial de suas atividades, como no caso dos profissionais de saúde, mormente aqueles empregados que atuam na linha de frente no combate à COVID-19.
Embora não se negue o direito ao exercício de greve pelos referidos profissionais, mormente a sanitária (que visa a proteção da saúde dos trabalhadores), deve-se verificar se, no caso concreto, esta é a medida mais adequada para a proteção dos seus direitos, verificando-se se não há outros meios protetivos, que sejam menos lesivos ao direito à saúde da população em geral.
Em busca da ponderação dos princípios e da concordância prática entre os direitos assegurados aos empregados em geral e a necessidade de se conter o avanço da COVID-19 e se atender a população que necessita de atendimento médico emergencial, devem os sindicatos e as demais entidades legitimadas para o exercício da ação coletiva buscar meios alternativos para persuadir os empregadores a cumprir as normas de segurança, adotando medidas preventivas de contágio da doença.
Dentre as medidas que podem ser tomadas pelas entidades sindicais, destaca-se o ajuizamento de ação civil pública visando a imposição de obrigação de fazer ao empregador, com cominação de medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias para assegurar o respeito à proteção do meio ambiente de trabalho e à saúde dos trabalhadores, tais como a adoção de protocolos de prevenção de contágio à COVID-19, a exemplo do fornecimento de EPI’s, sanitização do ambiente e medição de temperatura corporal.
Para impor o cumprimento das referidas obrigações, pode a entidade sindical pleitear que o juiz comine multa coercitiva (astreintes) para o caso de não cumprimento da obrigação de fazer.
No caso de as obrigações de fazer não ser cumpridas pela empregadora mesmo após a adoção de medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias, parece-nos que mesmo nesse setor estariam os empregados autorizados, de modo individual, a se recusar a trabalhar, sem prejuízo dos salários, em razão de haver risco grave e iminente à sua saúde e segurança (artigos 13 da Convenção n. 155 da OIT[15] e 229, § 2º da Constituição do Estado de São Paulo[16]).
Não se trata propriamente de greve sanitária, mas de direito individual de cada empregado à recusa ao trabalho, no exercício do seu direito de resistência.
Ainda, de modo excepcional, poderá a entidade sindical – frustradas as tentativas de proteção do meio ambiente laboral e da saúde dos trabalhadores com a utilização de meios menos lesivos à saúde da população em geral – deflagrar a greve sanitária, como ultima ratio na proteção dos direitos dos trabalhadores. Não se nega que se trata de medida extrema, mas a omissão patronal e a gradação das medidas justifica a sua utilização, até mesmo porque, parafraseando José Afonso da Silva, a proteção do meio ambiente de trabalho dos profissionais de saúde significa a proteção da saúde de toda a população que utiliza os serviços de saúde, já que a ausência de equipamentos eficazes de proteção, coletivos e individuais, e de outras medidas preventivas da saúde destes profissionais, coloca em risco não somente os trabalhadores, mas também os pacientes e demais usuários do serviço.
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[1] Juiz do Trabalho Substituto no Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região; Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade Anhanguera – SP; Graduado em Direito pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Ex-Chefe de Gabinete do 3° Ofício da Procuradoria Regional do Trabalho da 6ª Região. Ex-Advogado.
[2] Juiz do trabalho Substituto no Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região; Especialista em Direito e Processo do Trabalho (CESUL – Francisco Beltrão/PR); Especialista em Direito Processual Civil (UNINTER Curitiba/PR); Graduado em Direito (UCP – Faculdades do Centro do Paraná); Ex-Diretor de Secretaria de Vara do Trabalho no TRT-9; Ex-Assistente de Juiz do Trabalho no TRT-9.
[3] Servidores do INSS farão greve e não retomam atividades presenciais na terça. Economia IG, 2020. Disponível em https://economia.ig.com.br/2020-09-07/servidores-do-inss-farao-greve-e-nao-retomam-atividades-presenciais-na-terca.html. Acesso: em 29 set. 2020.
[4] Há autores que se referem à eficácia diagonal dos direitos fundamentais nos casos de incidência dos referidos direitos em relações jurídicas assimétricas, como a relação empregatícia.
[5] ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO. Declaração de Filadélfia. Disponível em: https://www.ilo.org/wcmsp5/groups/public/—americas/—ro-lima/—ilo-brasilia/documents/genericdocument/wcms_336957.pdf. Acesso em 21jun.2020.
[6] De igual modo há o referido reconhecimento na Declaração Sociolaboral do Mercosul.
[7] Em tradução livre: Artigo 44 – Direitos dos trabalhadores em caso de perigo grave e imediato
[8] A bem da verdade, o termo original em francês é droits d’alerte et de retrait. Entendemos que o retrait neste caso não tem o sentido que assume em outras normas como sendo aposentadoria, mas de ou até de rescisão, em virtude da sua própria significação na norma transcrita.
[9] Em tradução livre: O trabalhador alerta imediatamente o empregador sobre qualquer situação de trabalho em que haja motivos razoáveis para pensar que ela representa um perigo grave e iminente à sua vida ou saúde, bem como sobre qualquer defeito que constatar nos sistemas de proteção.
Ele pode se retirar de tal situação.
O empregador não pode pedir ao trabalhador que exerceu o seu direito de afastamento/rescisão o retorno à sua atividade numa situação de trabalho em que persista um perigo grave e iminente, resultante, principalmente, de uma deficiência do sistema de proteção.
[10] Em tradução livre: Nenhuma sanção ou dedução de salários pode ser aplicada a um trabalhador ou grupo de trabalhadores que se retiraram de uma situação de trabalho que eles tinham motivos razoáveis para acreditar que representava um perigo sério e iminente para a vida ou saúde de cada um deles.
[11] Em tradução livre: A trajetória do discurso internacional acerca do direito de greve sugere, fortamente, a existência de uma norma de direito costumeiro internacional. As práticas estatais refletidas nas constituiçõs, leis e decisões das Cortes Nacionais da maioria dos países confirmam o direito de greve. Os limites podem variam de país a país, mas subjacente a ele está o consenso de que o direito existe, e os seus limites devem ser razoáveis. Além disso, os Estados rspeitam esse direito como um senso de obrigação legal e não meramente moral.
[12] DICIONÁRIO PRIBERAM. Disponível em https://dicionario.priberam.org/sanitária, acesso em 02 out. 2020.
[13] No original, em inglês: “Secondly, the employer’s obligation to provide security is outweighed by the employee’s right to withdraw (L. 4131 -1 et seq. of the Labour Code). An employee may withdraw from a work situation which he/she has reasonable cause to believe it implies a serious and imminent danger for his/her life or health. This situation must be notified to the employer. This is an individual and subjective right. In particular, this right to withdraw may be used if the employer does not put in place appropriate measures taking into account the current health situation”.
[14] (RO – 1001747-35.2013.5.02.0000 , Relatora Ministra: Kátia Magalhães Arruda, Data de Julgamento: 15/05/2017, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Publicação: DEJT 19/05/2017)
[15] Art. 13 — Em conformidade com a prática e as condições nacionais deverá ser protegido, de conseqüências injustificadas, todo trabalhador que julgar necessário interromper uma situação de trabalho por considerar, por motivos razoáveis, que ela envolve um perigo iminente e grave para sua vida ou sua saúde.
[16] Artigo 229 – Compete à autoridade estadual, de ofício ou mediante denúncia de risco à saúde, proceder à avaliação das fontes de risco no ambiente de trabalho e determinar a adoção das devidas providências para que cessem os motivos que lhe deram causa.